sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Artemisia Gentileschi

Este texto é uma tradução adaptada livremente por mim. O original pode ser visto aqui.



rgfellows
Para aqueles que não sabem, a artista barroca Artemisia Gentileschi é a autora.

Gentileschi foi uma pintora mulher em uma época em que era improvável para uma mulher ser um artista. Ela conseguiu a oportunidade para treinar e eventualmente conseguiu um emprego porque seu pai, Orazio, já era um mestre pintor bem estabelecido, e era muito insistente quanto a ela obter formação artística. Ele, aparentemente, viu um alto grau de habilidade em algumas obras de arte que ela fez como um hobby na infância. Ele era muito favorável a ela e encorajou-a a resistir à "atitude tradicional de submissão psicológica, lavagem cerebral e a inveja de seu talento óbvio."
Gentileschi tornou-se extremamente bem conhecida em seu tempo para a pintura de figuras femininas em sofrimento da Bíblia. Por exemplo, a que está acima retrata a história do livro de Daniel. Susanna está banhando-se em seu jardim quando dois velhos começam a espioná-la nua. Quando ela termina, eles a deteram para dizer-lhe que eles vão contar a todos que a viram ter um caso com um jovem (ela é casada por isso este é um crime punível com a morte), a menos que ela faça sexo com eles. Ela se recusa, eles espalham a história, e ela vai ser condenada à morte quando o protagonista do livro (Daniel) impede.
Então, essa pintura acima? Essa foi a sua primeira pintura principal. Ela tinha DEZESSETE ANOS DE IDADE. Para vocês se contextualizarem, esta é uma pintura da mesma história que Alessandro Allori fez apenas quatro anos antes, em 1606:


Uau. Isso não se parece com uma mulher sendo ameaçada com uma escolha entre morte ou estupro. Então, imagine Artemisia, de 17 anos, tentando retratar em uma pintura a cena de uma mulher sendo agredida. Na imagem em preto e branco, Kathleen Gilje fez uma interpretação da pintura. Uma mulher em estado de horror, uma angústia grotesca, segurando o que parece ser uma faca em sua mão fechada. As mulheres, em pinturas mais antigas, não podem ter um olhar grotesco. A agressão sexual não pode ser descrita como horrível. E as mulheres definitivamente não podem ser vistas como tendo potencial para lutar e se defender. Certamente não em obras de arte. As mulheres precisam de ser suaves. Elas precisam esmurecer perto de seus captores, mas ainda ficarem bonitas e serem donzelas em perigo. Artemisia fez uma representação mais apropriada da cena do que Allori, mas Kathleen Gilje a adaptou de uma forma ainda mais dramática em 1998.

O que é interessante notar é que ela, eventualmente, se sentiu presa e limitada com algumas de suas próprias representações menos tradicionais das mulheres. No entanto, isso é mais interessante com contexto.

(Aviso: referência ao estupro, tortura e imagens de pinturas que mostram a violência e sangue.)

Assim, a história de Gentileschi continua no ano seguinte, 1611, quando seu pai contrata Agostino Tassi, um artista, para ser seu tutor particular. Foi nesse momento em que Tassi a estuprou. Ele então passou a prometer que se casaria com ela. Ele ressaltou que, se ela se casasse com um homem que não foi o "dono" de sua virgindade, então sua vida estaria arruinad. Usando isso, ele emocionalmente a manipulou para manter relações sexuais com ele, mas ele acabou se casando com outra pessoa. Horrorizada com o rumo dos acontecimentos, ela procurou seu pai. Orazio não quis tolerar essa merda e levou Tassi para a Justiça. Naquela época, o estupro não era tecnicamente uma ofensa para justificar um julgamento, mas o fato de que ele tinha tomado a sua virgindade (e, portanto, tecnicamente "danificado propriedade de Orazio". Ugh.) fez com que o julgamento continuasse. Durou 7 meses. Durante este tempo, para provar a verdade de suas palavras, Artemisia se submeteu a exames ginecológicos invasivos e até foi questionada via tortura. Também foi descoberto durante o julgamento que Tassi estava planejando matar sua atual esposa, ter um caso com a irmã dela e roubar uma série de pinturas de Orazio. Tassi foi considerado culpado e foi condenado a uma pena de prisão de .... UM. ANO. Que ele nunca cumpriu, porque a sentença foi anulada.

Durante este tempo e um pouco depois (1611-1612), Artemisia pintou sua obra mais famosa, Judite Matando Holofernes. Esta história da Bíblia envolveu Holofernes, um general assírio, que levou tropas para invadir e destruir Betúlia, o lar de Judite. Judite decide lidar com este problema e se aproximou do general, flertando com ele e deixando-o com a guarda baixa. Ofereceu comida e muito vinho. Quando ele dormiu, Judite, com a ajuda da criada, pegou uma espada e cortou a cabeça dele. Problema resolvido. O assunto era muito popular para a arte na época. Aqui está uma versão da cena pintada em 1598-99 por Caravaggio, que foi uma grande influência de Artemisia:



Esta representação é um bom exemplo de como esta cena foi descrita tipicamente. Artistas frequentemente tentavam desassociar Judite da violência real do ato (de tê-lo cometido). Desta forma, eles poderiam evitar a perda da moral da personagem e também evitariam mostrar uma mulher cometendo tal agressão. Então, aqui vemos uma jovem Judite de olhar delicado usando um vestido puro e branco. Ela delicadamente assassina esse homem enorme e parece bastante enojada e contrariada por ter que fazer isso. Agora, este é o de Artemisia:



Caralho. Isso é uma cena totalmente diferente. Holofernes não se parece com um cara que está surpreso pelo que está acontecendo e sim um homem engasgado em seu próprio sangue. O sangue aqui é um vermelho menos brilhante que o retratado por Caravaggio mas de alguma forma soa mais repugnante. Parece mais real e jorra de uma forma muito menos estilizada do que o de Caravaggio. Para não mencionar, Judite aqui está longe de ser afastada de sua violência. Ela está colocando seu peso físico neste ato. Suas mãos (com aparência muito mais fortes do que as representações femininas na arte) estão trabalhando duro. Seu rosto também é completamente diferente. Ela não parece necessariamente incomodada, mas sim determinada.

Também vale a pena notar que a criada está agora envolvida na ação. Vale a pena notar porque, durante seu julgamento de estupro, Artemisia afirmou que ela havia gritado por ajuda durante o estupro inicial. Especificamente, ela tinha pedido ajuda para a inquilina de Tassi, Tuzia. Tuzia não só ignorou seus gritos de socorro, mas ela também negou todo o acontecimento. Tuzia tinha sido uma amiga de Artemisia e na verdade era uma de suas únicas amigas do sexo feminino. Artemisia se sentiu extremamente traída, mas ao invés de se voltar contra seu próprio gênero, este acontecimento incutiu-lhe a profunda importância das relações femininas de solidariedade entre as mulheres. Isto pode ser visto em algumas das suas obras, e eu acredito que no de cima, também, com a inclusão da criada no ato.

Além disso, é importante falarmos de Artemisia nos dias de hoje.

Naquela época e ATÉ hoje, há pessoas que argumentam que Artemisia teve muito auxílio de seu pai... Como se ele tivesse ajudado ela a pintar ou tivesse pintado tudo ele mesmo. Porra, há uma série de obras que só recentemente (passado vários anos ou mais) foram oficialmente atribuídas a Artemisia, porque as pessoas originalmente viam a assinatura "Gentileschi" e automaticamente atribuíam a Orazio. Assim, Artemisia Gentileschi não apenas foi uma artista maravilhosa e uma personagem histórica incrível, mas eu não posso ignorar que existem pessoas que, 400 anos depois, ainda não dão o crédito que ela merece, só porque ela é uma mulher e, obviamente, as mulheres não podem pintar como ela o fez.

Um comentário:

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